quarta-feira, 14 de junho de 2017

TSE dá sobrevida ao presidente


Excepcionais os textos de Migalhas de dia desta semana.

Irreparável.

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Game Over

TSE dá sobrevida ao presidente da República. (Clique aqui)

Blábláblá

Os jornais debatem muito a decisão do TSE. Mas é preciso lembrar que decisão judicial não se discute. Apenas lamenta-se.

Defesa

Diante da notícia de uso da Abin para investigar o ministro Fachin, a ministra Cármen Lúcia, enfim, sai em defesa do relator da Lava Jato. (Clique aqui)

Defesa - II

Em nota, Janot faz o mesmo: "Há uma colossal diferença entre investigar dentro dos procedimentos legais, os quais preveem garantias aos acusados, e usar o aparato do Estado para intimidar a atuação das autoridades com o simples fito de denegrir sua imagem e das instituições a qual pertencem."

Defesa - III

A OAB avisou: "Se for confirmada a denúncia de que o presidente da República usa órgãos de Estado, como a Abin, para conduzir investigações políticas contra algumas autoridades, estaremos diante de um ataque direto ao Estado Democrático de Direito. Não podemos aceitar que o Supremo Tribunal Federal seja vítima de arapongagem política. É preciso esclarecer os fatos e, se as acusações forem confirmadas, punir os responsáveis, pois ninguém está acima das leis e da Constituição da República."

Monteiro Lobato no TSE

No julgamento do TSE, Gilmar Mendes citou uma passagem da obra "A Reforma da Natureza", de Monteiro Lobato. O trecho citado pelo ministro já estava na obra "Fábulas", na qual Lobato reescreve textos de La Fontaine e Esopo. No texto mencionado, Lobato diz mais ou menos o seguinte: um cidadão, Américo Pisca-Pisca, quer reformar a natureza, e acha que seria mais lógico pôr as abóboras na jabuticabeira, e as jabuticabas crescendo ao chão. Feito isso, vai descansar embaixo de um antigo pé de jabuticabas, quando lhe cai o novo fruto na cabeça. Moral da história...

Segunda parte

Ninguém duvide, todas as reformas que forem diferentes daquela que S.Exa. entende como corretas receberão essa fábula de presente. Mas o fato é que este é apenas um trecho da obra referida lobatiana, a qual segue adiante. Com efeito, enquanto toda a turma do Sítio do Pica-Pau Amarelo segue para a Europa, a fim de ajudar a reconstruir o mundo após a 2ª guerra, Emília fica no Sítio reformando a natureza. Logo depois, na segunda parte da obra, chega Visconde de Sabugosa, e faz mudanças nas glândulas dos animais, alterando profundamente suas estruturas. Ao final, como sempre, tudo acaba bem, e os pequenos leitores (no tempo de Lobato) têm uma aula de fisiologia e de história.

Entrevista onírica

Ao evocar a figura de Monteiro Lobato, resolvemos usar uma pitada do pó de pirlimpimpim e viajar pelo desconhecido. Caímos num apartamento situado na rua Barão de Itapetininga, 93, no centro de SP. O calendário marcava 3 de julho de 1948. Estávamos num sofá elegante, numa ampla sala. Pelas janelas era possível divisar as altas árvores da vizinha praça da República. D. Purezinha, delicada, veio nos trazer o café em bule inglês e disse que o marido já estaria chegando. Afobado, sobraçando alguns livros, eis que surge o inconfundível morador: Monteiro Lobato. Senta-se na poltrona principal e logo diz: - Pois não, meus jovens? Explicamos que estávamos viajando no tempo, e que um ministro (o qual fizemos questão de descrever com detalhes, sem tirar nem pôr) tinha citado trecho de sua obra. Ele, então, depois de achar curioso o nome de nosso rotativo, decide nos dar uma entrevista, a qual segue abaixo, com exclusividade:

Migalhas - No livro citado pelo ministro, a Emília apronta muitas maluquices. Não está muito independente essa boneca de pano?

Monteiro Lobato - "Tão independente que nem eu, seu pai, consigo dominá-la. Quando escrevo um desses livros, ela me entra nos dois dedos que batem as teclas e diz o que quer, não o que eu quero."

Migalhas - E a propósito da fábula mencionada, o que nos diz?

Monteiro Lobato - "A natureza sabe o que faz. Põe frutas grandes no chão e as pequenas em árvores."

Migalhas - Moral da história...

Monteiro Lobato - "Quando reformamos qualquer coisa, aparecem logo muitas consequências que não previmos."

Migalhas - E qual mudança seria bem-vinda?

Monteiro Lobato - "Se os homens fossem do tamanho de pulgas, seriam mais felizes. A desgraça dos homens está no tamanho."

Migalhas - Podemos pôr mãos à obra, então?

Monteiro Lobato - "Reforma não é brincadeira, precisa ciência."

Migalhas - Pelo que entendemos o problema é o homem, não a natureza?

Monteiro Lobato - "É que a Natureza copia o homem; desdobra-se numa gama inteira. Tem os seus pedaços shakespearianos para o equilíbrio dos seus pedaços acacianos."

Migalhas - Literatura numa hora dessas?

Monteiro Lobato - "Literatura é cachaça. Vicia. A gente começa com um cálice e acaba pau d'água de cadeia."

Migalhas - Certo, mas não se esqueça que estamos em 2017. Como poderemos mudar o curso da história?

Monteiro Lobato - "A história é muito complicada, não pode ser dita em meia dúzia de palavras."

Migalhas - Você, com sua imaginação toda, iria acreditar que nosso presidente da República fosse estar nessa situação?

Monteiro Lobato - "Muitas vezes a gente imagina uma pessoa e sai o contrário."

Migalhas - Põe contrário nisso. E o duro é que ele está com sorte. Sim, pelo menos até agora escapou das garras da Justiça.

Monteiro Lobato - "Evidentemente a Sorte é irmã da Justiça - tem a cegueira das minhocas."

Migalhas - De fato, olvidar as provas e com isso absolver a chapa é surreal.

Monteiro Lobato - "Não há o que não se consiga quando o processo aplicado é o faz-de-conta."

Epistolário

As "respostas" de Monteiro Lobato são extraídas, sobretudo, da própria "A Reforma da Natureza". Outros excertos foram pinçados na "Barca de Gleyre", que reúne a correspondência travada com o amigo Godofredo Rangel por 50 anos. Rangel, autor do célebre "Vida Ociosa", contemporâneo de Lobato nas Arcadas do Largo S. Francisco, foi desembargador em MG. Segundo consta, as cartas que ele mandou a Lobato existem, e estão guardadas. Uma pena que a família do saudoso escritor não as enfeixe numa obra para domínio público. Se assim fizesse, contribuiria sobremaneira para a história da literatura brasileira


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